[sempre de acordo com a antiga ortografia]

quarta-feira, 25 de janeiro de 2012



Wagner e a Maçonaria (II)
(concl)


Já em Salzburg, até parece que estou em Bayreuth, preocupado com a segunda parte do meu artigo "Richard Wagner e a Maçonaria". A verdade é que me atrasei, com uma série de questões pendentes que, felizmente, consegui resolver antes de viajar para aqui. E, como compreenderão, preocupado que estava com o Wagner, não podia começar a debitar sobre Mozart e Salzburg antes de despachar o assunto. Depois de me ter situado, já posso deixar esta pequena introdução para retomar a matéria.


Continuando a vasculhar a biografia de Richard Wagner, provou-se que, efectivamente, o pai do compositor foi maçon e que, depois da sua morte, os seus Irmãos Pedreiros-Livres de Dresden passaram a proteger a família, assumindo as despesas da escolarização de um dos irmãos de Richard que frequentaria uma escola patrocinada pela Maçonaria local.

Mais tarde, num dia 10 de Janeiro de 1835, data em que Richard Wagner ainda não tinha feito vinte e dois anos – o aniversário é a 22 de Maio – dirigiu a Abertura da sua ópera “Die Feen”, no âmbito de um concerto organizado por um tal senhor Lafont, promovido pela Loja Maçónica “Ferdinand zur Glückseligkeit” de Magdeburg, cidade onde o jovem Wagner manteve um posto de trabalho. Já que entrei neste pormenor, então ainda faltará acrescentar que, três dias passados, lá foi tocada a Abertura que Wagner compusera para uma peça de Wilhelm Schmale, escrita para assinalar o Novo Ano.

Cumpre ainda referir que Ludwig Geyer, padrasto de RW (que alguns biógrafos consideram poder ser, afinal, o verdadeiro pai do grande mestre…), tinha sido iniciado, em 1804, na acima referida Loja que, juntamente com outra oficina maçónica, a “Harpokrates”, desempenhavam destacado papel na vida musical daquela cidade.Já depois de conquistada a notoriedade, conhecem-se-lhe várias tentativas no sentido de se aproximar da Maçonaria tentando que aceitassem a sua Iniciação.

Às impressões da infância e juventude ter-se-ão juntado as influências dos mais notáveis artistas contemporâneos, entre os quais o seu próprio sogro, Franz Liszt, e outros altamente colocados na hierarquia maçónica.Remonta a 1841 – curiosamente, pouco tempo antes da sua vinda a Portugal – a admissão e Iniciação de Liszt na Loja “Zur Einigkeit” de Frankfurt, ainda que tenha sido posteriormente, em Berlin, que ascendeu aos graus de Companheiro e Mestre, na Loja “Zur Eintracht”.

Aliás, é à luz da verdadeira fraternidade maçónica que deve ser entendida a sua protecção a vários artistas, entre os quais Wagner, que foi um dos principais beneficiados. Prosseguindo, veremos que, ao tempo, um dos mais conhecidos maçons alemães, o professor Oswald Marbach, casou com Rosalie, nem mais nem menos do que irmã de Wagner. Durante trinta anos foi Venerável da Loja “Balduin zur Linde” em Leipzig, tendo sido distinguido como membro de honra por mais de cinquenta Lojas.

A partir de certa altura, Wagner aproximou-se mesmo bastante do cunhado.Um outro contacto pessoal da maior relevância foi com o banqueiro Friedrich Feustel, alguém que se revelou perfeitamente imprescindível para a concretização do projecto do Festival de Bayreuth. Este maçon, figura das mais importantes da Maçonaria alemã, pertencia à Loja “Eleusis, zur Verschwiegenheit” de Bayreuth na qual Richard Wagner pretendeu ser admitido.

Ora bem, tamanho desafio, ao contrário de todos os outros aos quais o compositor se lançou – alguns dos quais, como sabemos, bem megalómanos… – acabou por não ser concretizado. A vida amorosa de Wagner era complicada, algo escandalosa, como o escabroso episódio da ligação com Cosima Liszt, mulher do seu amigo, o maestro Hans von Bülow.

O mínimo que poderá afirmar-se é que tais evidências não são nada compagináveis com os bons costumes que a moralidade maçónica exige a quem pretenda candidatar-se à condição de membro. Por outro lado, igualmente, muito terão pesado os ataques que Wagner sofreu pela influência que exercia sobre o Rei Luís II que conduziram a gastos, na altura, considerados gigantescos e incomportáveis para o erário do reino da Baviera.

Nestas circunstâncias, Friedrich Feustel tudo fez para que não se concretizasse o intento e, de acordo com testemunhos consultados, Richard Wagner mais não teve do que conformar-se com a indisponibilidade da Maçonaria para o convidar a ingressar no seu seio. Será interessante lembrar ter sido este mesmo Feustel que, junto ao caixão do compositor, proferiu as seguintes palavras: “A posteridade há-de entender mal como foi possível tornar tão difícil a concretização dos seus objectivos a um homem de tamanha grandeza”.

João de Freitas Branco, no artigo já citado, pergunta se o orador estaria a pensar num ‘Richard-Parsifal’ sem acesso à Loja-castelo do Graal, por vingança de algum Klingsor* ou se, antes, se trataria duma seita de Beckmessers...**

Julgo que me acompanharão na conclusão de que não poderia ter escolhido melhor remate para estas considerações. Ah, como fazem falta o João de Freitas Branco e homens da sua geração, cultos, lúcidos, empenhados, tais como o Joly Braga Santos, Nuno Barreiros, Maria Helena de Freitas, João Paes de Freitas Branco e o meu próprio pai, que pertencia ao mesmo grupo, a quem tudo deve a minha melomania na procura de ser o mais possível esclarecida.

Lembrar-se-ão de que, no artigo anterior, referi uma passagem de Fidelio. Resolvi hoje proporcionar-vos o visionamento de uma boa proposta do MET de Nova Iorque, sob a direcção de James Levine, que, além de um excelente elenco (em que, no papel de Pizarro está Falk Struckmann, há dias presente numa versão concertante de Tannhäuser na Gulbenkian) tem a vantagem de apresentar legendas em Inglês. Portanto, toca a descobrir onde se encontra a tal citação. Bom visionamento! Boa audição!

http://youtu.be/T7QXkNILErg
Beethoven - Fidelio (Levine).
http://www.youtube.com/

* personagem de Parsifal
**personagem de Os Mestres Cantores de Nuremberga



2 comentários:

Sintra do avesso disse...

Transcrições do YouTube:

Isabel Claro, Nuno Oliveira, Raquel Gameiro, António Filipe e Vasco Gomes gostaram do artigo

João De Oliveira Cachado

Esqueci-me de introduzir a informação correspondente a * que se referia à conhecida personagem de "Parsifa"l e a ** outro personagem da ópera "Os Mestres Cantores de Nuremberga".
há 7 horas

Luis Miguel Correia Lavrador Que regalo! Irei escutar com toda a atenção, assim que estiverem reunidas as condições ideais. E vem aí o Mozart, tenho que me apressar. Grande abraço, João :)
há 7 horas

Fernando Castelo Um grande abraço.
há 6 horas

João De Oliveira Cachado

Vamos com calma. Nada de pressas. Sabe o que diz o ditado das cadelas apressadas, não sabe? Eu não conheço melhor acerca da lufa-lufa em que todos parece andarem como se fossem tirar o pai da forca... E lá ocorreu outro ditado. Aqui, em Sal...zburg, onde tanto trabalho, onde os meus amigos tanto trabalham, pressa é coisa que não há. Bom ritmo, ritmo adequado? Ah, isso sim, todos os dias. É tão diferente do que se passa entre nós... Abraço muito salisburguense, salpicado de uns farripos de neve, olhando os telhados brancos, mesmo em frente, através da janela do quarto, em St. Sebastian.
há 6 horas

Maria Do Rosario Billwiller Se beberes Glühwein pensa e mim. Ontem assisti Fledermaus. às vezes coisas mais ligeiras tambem fazem bem a alma. Viel spaß. Nao comas demasiado Mozart kugel.
há 6 horas ·

João De Oliveira Cachado

A si, meu querido Amigo Fernando Castelo, também o meu abraço. Por economia de termos, sinta-se também envolvido no que enviei ao Luís Miguel Correia Lavrador. Estou com a «nossa gente», Fernando Castelo. A «sua» Baviera -há outro Fernando... (o Pessoa) que, no dizer de Eduardo Lourenço, é o Rei da nossa Baviera - fica 'mesmo aqui'. Se o meu amigo fosse rei só podia ser da Baviera, tanto que ela em si está entranhada. Esta, como sabe, é uma germânia diferente, católica até à medula, mais próxima de nós, latinos, mas tão distante na civilidade de cada dia que passa. Esta Salzburg, tão próxima da capital bávara onde ontem aterrei, também vive o mesmo sério caso de sucesso que não tem nada de acaso. Aqui em Salzburg, tal como o meu amigo em Munique, sou mais verdadeiro, mais genuíno do que naquela que é a minha terra. Por vezes, chego a perguntar-me se será mesmo assim, se não andarei trocado... E o melhor é ficar por aqui porque o outro lugar máximo da minha eleição, Bayreuth, é um rincão bávaro que me tem cativo desde sempre e para sempre.
há 6 horas

Sintra do avesso disse...

João De Oliveira Cachado

Minha querida Rosário, que bons conselhos! está descansada, terei cuidado. Quanto aos Kügeln, que mais poderiam engordar, só consumo fora de Salzburg. E, jamais os da embalagem vermelha, da marca Mirabel - que tantae excelente música patrocina!... - os mais comuns. Não direi que são péssimos mas os verdadeiramente especiais e sofisticados são os do confeiteiro "Fürst", os da cor azul, também mais caros. Claro que o passeio não me faltará. Como tenho muito, muito que fazer, aqui faço a caminhada a partir das seis e meia da manhã. Por acaso, hoje, acordei mais tarde - depois de um sono maior, reparador da canseira da véspera - e só saí de St Sebastian às sete r um quarto. Nem queiras saber como logo alterou o programa...
há 5 horas

João De Oliveira Cachado

‎[Cont. de msg pª Maria do Rosário Billwiller] Porque não apareces por cá? Sabes bem o caminho.Como gostas tanto deste cantinho adorável, que não é o bilhete postal que tanta gente julga, aparece. E, se te portares bem, apesar de tudo esgotado, até sou capaz de te arranjar uns bilhetes para uns concertos. Sabes que, em Salzburg, depois do Burgermeister, só o teu primo... Um grande beijinho
há 5 horas

João De Oliveira Cachado

agora é a Raquel Gameiro, o António Filipe, o Vasco Gomes assinalando como gostam da minha ligação. Obrigado. Eu faço o possível por vos prestar um bom serviço. Abraço a todos.
há 5 horas

João De Oliveira Cachado Agora, em especial, ao Vasco. Olha lá, não eras tu que, com a tua mulher, estavam na Gulbenkian na récita concertante da "Tannhäuser"? Pareceu-me ver-vos, mesmo à minha frente, tu a desmanchares esse teu fabuloso rabo de cavalo. Contudo, pensando que estarias em Veneza, como não tive a certeza, contive-me. Abraço
há 5 horas

Maria Do Rosario Billwiller Estás-me a tentar pois daqui tenho aviao directo e que somos ua familia importante já tinha imaginado. Há muita neve? Aqui ainda nao tivemos este ano. Tens razao é lindo passear ai. beijo e que gozes muito.
há 5 horas

João De Oliveira Cachado Está algum frio, mas nada daquelas temperaturas baixas que costumo aguentar. Há neve mas não muita. Hoje caíram uns farripos pouco consistentes. Como sabes, se a temperatura se mantiver amena, a neve vai-se. Agora vou ter mesmo de saír para um encontro com uma amiga do Mozarteum. Beijinho
há 5 horas

Fernando Castelo João: Unser ganzes leber lang. Auf wiedersehen.