[sempre de acordo com a antiga ortografia]

domingo, 16 de novembro de 2014



SINTRA,

PELA CAUSA DA DEFESA DO PATRIMÓNIO DE SINTRA
______________________________________

- A PROPÓSITO DA INSTALAÇÃO DE PARQUES DE ESTACIONAMENTO NA PORTELA E NA ESTEFÂNEA

- ACESSO EXPEDITO E OPERACIONAL AOS MONUMENTOS NO ALTO DA SERRA:

FUNICULARES!
                                  FUNICULARES!
                                             
_______________________________________


[Passo a transcrever o artigo que subscrevi para a edição de ontem do "Jornal de Sintra". Trata-se de um texto longo, numa primeira reacção às propostas apresentadas pelo executivo camarário sobre estacionamento e acesso aos pontos altos da Serra, durante a designada "Presidência Aberta" no passado dia 7.]

________________________________________

 
Presidência aberta à mudança
 
 
No passado dia 7, por ocasião da iniciativa Presidência Aberta, integrei o grupo que acompanhou o Senhor Presidente da Câmara Municipal de Sintra nas deslocações previamente programadas. Desde já, gostaria de referir que a União das Juntas de Freguesia de Sintra, obrigada a uma logística sem quaisquer folgas, com elevado número de participantes, transportes, refeições, distâncias a percorrer, obedecendo a um horário cerrado, revelou assinalável eficácia organizativa, assim contribuindo para o êxito da jornada.
 
Especialmente atento às questões relativas ao estacionamento, trânsito e transportes, que tanto me têm ocupado e preocupado, aliás, como é fácil constatar através das páginas deste jornal, se não vi defraudada a minha expectativa, uma vez que notícias não faltaram, a verdade é que o seu teor veio confirmar como ainda é preciso desenvolver tanto trabalho cívico no sentido de estar à altura dos desafios impostos pelas mudanças em perspectiva.
 
É neste contexto que gostaria de destacar duas das medidas cujo anúncio logo constituiu pretexto para os mais empenhados comentários entre participantes. Cumpre vos dê conta de ter registado, com particular agrado, não ter a Câmara apresentado medidas desgarradas e, pelo contrário, tal como há tantos anos tenho advogado, notar como a intervenção futura privilegia a obediência a uma grelha matriz, no quadro de uma concepção sistémica que, a montante, é condição sine qua non para que a concretização dos projectos revele imprescindível e coerente articulação.
 
I.  Estacionar
 
Pois, precisamente por ter em consideração ser esta a moldura conceptual – e, felizmente, não a outra que designaria como dos avulsos & remendos, cuja persistência tanto tem prejudicado a qualidade de vida da comunidade – é que me permito suscitar alguma reflexão acerca das duas áreas de estacionamento anunciadas. Ou melhor, explicitando, o Parque da Portela, resultante da requalificação da área circundante o edifício do Departamento do Urbanismo [DU] e o Parque da Estefânea, pela construção de um novo, na zona da Correnteza, em terrenos pertencentes aos herdeiros dos proprietários da Vila Eugénia e de João Justino.
 
Se bem julgo ter entendido, quer pelas intervenções durante a Presidência Aberta quer através da sua esclarecedora entrevista ao Jornal da Região de 29 de Outubro, uma grande e natural preocupação do Senhor Vereador Luís Patrício, com o pelouro do trânsito e estacionamento, é a resolução do parqueamento das viaturas dos utentes do Centro Cultural Olga Cadaval [CCOC].
 
Tanto tenho escrito acerca do assunto na imprensa local e nas redes sociais que, clara e entusiasticamente, só posso saudar tão saudável inquietação. No entanto, desde já, chamaria a atenção para uma circunstância a ponderar, com todo o cuidado, e em duas vertentes.
 
Em primeiro lugar, quanto ao CCOC, numa esmagadora maioria de casos, é em horário nocturno, em especial mas não exclusivamente, às sextas-feiras e durante o fim de semana, que se registam os grandes problemas, quando a afluência aos eventos, quase ou totalmente, esgota a lotação do grande auditório, resultando numa inenarrável situação caótica nas imediações, também em consequência da ausência de qualquer autoridade policial que pudesse intervir e, nomeadamente, indicar a alternativa civilizada.
 
Também, aos sábados e domingos, por ocasião de espectáculos, festas de empresas e similares, de manhã, caso dos concertos para crianças, cujo horário coincide com o da Missa dominical, e vespertinos, mais uma vez coincidentes com o da Missa substituta da do dia seguinte, ambas na vizinha igreja paroquial de São Miguel, se verifica a mesma situação de grande confusão e perfeito desassossego.
 
Ora bem, de há muitos anos a esta parte, apesar dos meus constantes apelos no sentido de resolver tão grande transtorno através da utilização do parque do DU, a verdade é que, nem no tempo em que existia a ponte metálica de acesso à Heliodoro Salgado, e, embora facilmente concretizável, se conseguiu que tal objectivo fosse alcançado. Naturalmente, depois da remoção da referida expedita passagem que, igualmente permitia e facilitava o trânsito pednal entre a Portela e a Estefânea, tudo se complicou.
 
Actualmente, confirmada durante a Presidência Aberta, estamos perante a notícia segundo a qual a Câmara Municipal de Sintra pretende proceder à requalificação do recinto em apreço, transformando-o num parque de estacionamento, seguro, bem iluminado, operacional, com capacidade para mais de quatrocentos automóveis, prestando um serviço de qualidade inequívoca, o qual, por todas estas civilizadas razões, ninguém terá qualquer dúvida em aceitar como convenientemente tarifado, desde que asseguradas as devidas excepções.
 
Entretanto, duas coisas deverão acontecer. Uma primeira, inerente à absoluta prioridade desta requalificação sobre a de qualquer iniciativa afim da construção do Parque da Estefânea. E, em segundo lugar, de importância crucial, que a ponte seja reposta e, assim, permitindo que o acesso dos utentes do parque ao CCOC, grande preocupação do Senhor Vereador Luís Patrício, se realize, com toda a comodidade e rapidez, em apenas três minutos.
 
Também é do conhecimento geral que a reposição deste dispositivo, imprescindível ao acesso pedonal entre zonas tão críticas da sede do concelho, colide com o interesse de particulares, tendo já suscitado um difícil diferendo que à CMS cumpre liminarmente resolver, fazendo uso da autoridade democrática de que está investida, em resultado das eleições locais de 2013. Se fosse fácil qualquer um conseguiria. É difícil, é verdade, mas o interesse da comunidade não pode deixar de prevalecer e o executivo autárquico não pode deixar de manifestar esse importante sinal aos cidadãos.
 
Em relação àquele que, por maior facilidade de expressão, acima designei como Parque da Estefânea, fiquei a saber que, como não poderia deixar de acontecer, privilegia características de low profile. Conhecedor como é de Sintra, em geral, e daquele local em particular, o Arq. Diogo Lino Pimentel, alguém que muito prezo, autor do projecto, propõe uma solução discreta, cuja volumetria, parcialmente soterrada, o próprio perfil do terreno lhe concedeu.
 
Escrevendo sob reserva, já que não acedi à proposta, muitos detalhes me escapam. Mas estou em crer que, muito brevemente, a Câmara consultará os cidadãos e, em particular, as associações cívicas e culturais, cuja actividade se desenvolve no âmbito das áreas indissociavelmente relacionadas com as preocupações vertentes, tal sendo o caso das de defesa do património.
 
Nessa altura, haverá oportunidade de esclarecer todos os pontos inerentes aos estudos que terão justificado a escolha do local, nomeadamente, quanto ao acesso e saída de veículos, em horas de ponta, suas compatibilidades e pontos de fricção com a procura do trânsito que, de diferentes proveniências, acederá a montante, e do induzido a jusante, no sentido do centro histórico, articulação com a rede de transportes públicos, etc, etc.
Só para dar um exemplo, impõe-se a necessidade de certificar se o volume acrescido de significativa quantidade de veículos a sair, à tarde, em hora de ponta, terá sido contemplado e devidamente estudado em função da recente circunstância de, na mesma altura, já se verificar demora de cerca de vinte minutos para fazer o percurso desde o CCOC até à confluência da Correnteza com a Alfredo da Costa…
 
E, naturalmente, tudo isto sempre na presunção de que, com a necessária coerência, estas duas unidades integram o sistema geral de estacionamento em Sintra, portanto, na sua acepção de parques de proximidade, estarão em íntima articulação com os parques de estacionamento periférico, cuja instalação se concretizará nas imediações das entradas mais convenientes e com áreas disponíveis em zonas já despistadas das três freguesias.
 
II.  Subir, descer, suspender
 
Quase no final da manhã de trabalhos, já a caminho de São Pedro, o Senhor Presidente anunciou a vontade de a Câmara concretizar o projecto de instalação de um teleférico, entre Ramalhão e a Pena que me levou a evidenciar a maior e mais natural surpresa. É que, como muitos de nós bem sabemos, no quadro em que Sintra se abre ao interesse de tanta gente – nomeadamente, com uma tão significativa área do seu território classificada pela UNESCO como Paisagem Cultural da Humanidade – a solução teleférico coloca reservas de toda a ordem.
 
Surpresa porque, em suma, não tem qualquer hipótese de comparação, a operacional alternativa do funicular, que se espalda no directo, preciso e assertivo seguinte objectivo: em quatro, cinco minutos, a partir de um centro urbano que até pode ser um sofisticado centro histórico, vencer umas centenas de metros, através de carril adossado à encosta, sem qualquer impacto ambiental, simultaneamente transportando dezenas e dezenas de pessoas, em direcção a um ponto de interesse turístico no cume de um monte.
 
Em lugares com características e necessidades análogas às de Sintra, é a solução que mais difundida está em todo o mundo, em especial por essa Europa fora, nalguns casos há bem mais de uma centena de anos, funcionando com inquestionável e insubstituível funcionalidade. Exemplos famosíssimos não faltam. Como sabem, é o de Salzburg, um paradigma, aquele com o qual estou mais familiarizado. Outros, que também conheço, em  Itália, na Ilha de Capri ou no Lago de Como e no Vesúvio, outros e Espanha, Barcelona, como o de Montjuïc, ou Montserrat, funiculares de Sant Joan e de Santa Cova e tantos, na Suiça, em Luzern um famosíssimo e tantos, tantos mais.
Surpreendido fiquei – e retomo o fio à meada depois deste pequeno desvio – porque, tendo acompanhado o Prof. Sidónio Pardal em jornada de estudo de implantação dos funiculares de que Sintra precisa, trabalho que a própria CMS encomendou àquele que é considerado figura nacional de referência absoluta na gestão do território, julgava eu, com argumentos de pertinência máxima, que, tendo já sido encontrada a solução, apenas cumpria aguardar pela melhor oportunidade para a concretizar. 
 
Afinal, parece que assim não acontece. Revela-se imprescindível que trabalhemos no sentido de partilhar esclarecimentos. Com um exemplar discernimento, que tenho o maior prazer em destacar e valorizar na justa medida, o Senhor Presidente da Câmara, imediatamente, me chamou para transmitir a sua convicção de haver ali matéria que, em vez de se transformar num estéril qui pro quo, antes deve ser objecto de diálogo sereno e profícuo, até porque não há qualquer facto consumado, tudo está em aberto.
 
Não gostaria de terminar sem, desde já, aconselhar a todos os que puderem uma pesquisa perfeitamente acessível através da net, no sentido de se inteirarem da pertinência da sua adopção como meio de transporte barato, não poluente, sem impacto no tecido ambiental. No entanto, tal não significa que o teleférico seja um «proscrito», como meio de transporte capaz de vencer importantes desníveis. A verdade é que o deveremos remeter para enquadramentos outros, por exemplo, para o transporte turístico, no sentido de s utentes desfrutarem os impressionantes panoramas da paisagem, entre a Pena e Capuchos. Mas, para o efeito, a UNESCO considerará que tal projecto se adequa à classificação deste território?  
 
Finalmente, um convite a um exercício que, estou certo, vos agradará. Pensemos no caso do visitante que chega a Sintra, vindo de Lisboa e passa por Ranholas, e noutro, que provém de Cascais, ambos entrando em Sintra pelo Ramalhão. Num futuro que todos gostaríamos seja muito breve, estacionarão o seu carro no parque periférico ali à disposição e, consoante o seu plano de visita, andarão uns metros a pé até à zona do estádio do 1º de Dezembro, onde tomarão o funicular para Santa Eufémia, com imediato acesso ao Parque da Pena, aí iniciando uma visita, e dispondo de outros meios de transporte incluindo os hipomóveis…
 
 
Não, não se trata de sonho. Mas, antes, tal como já referido aida muito trabalho teremos de partilhar. É o trabalho de consulta, troca de argumentos que melhor habilitem às decisões políticas que irão configurar o futuro da comunidade de Sintra, sempre numa perspectiva integrada, segundo a qual, repito, defesa do património natural edificado é indissociável da eficaz resolução e questões de estacionamento automóvel, rede coerente de diferenciados transportes públicos urbanos, encerramento e condicionamento de trânsito no acesso ao centro histórico pontos altos da Serra, rigoroso regime de cargas e descargas, etc
 
Finalmente, a fase que precede a resposta eficaz ao enorme desafio que, há já tantos anos, se tem vindo a adiar.
 
[João Cachado escreve de acord com a antiga ortografia]
 
 

Sem comentários: