[sempre de acordo com a antiga ortografia]

sábado, 29 de agosto de 2015



Como estar à altura?


Quem se der à rápida tarefa de verificar que textos escrevi nos últimos dois ou três dias, encontrará as sacrossantas efemérides mozartianas; mais um manifesto de oposição ao malfadado projecto do teleférico; referências às obras que a Parques de Sintra vai continuando e finalizando sempre com o maior sucesso; até uma certa ironia a propósito dos travesseiros de Sintra e à complementar sugestão de os acompanhar do melhor Collares branco; alusões a previsíveis movimentações políticas, suscitadas por uma entrevista de Jerónimo de Sousa à TVI, afins das próximas eleições legislativas e, ainda ontem, a chamada de atenção para a reabertura do simpático bar da Galeria Real em São Pedro.

Assim, mais ou menos ao correr da pena, nalguns casos até despreocupadamente, parece que estarei de perfeitíssimo humor e a passar muito bem graças a Deus. A verdade, no entanto, é que não estou. A verdade é que não posso estar mais atónito, incomodado, incapaz, de mãos atadas, impotente, sem saber o que dizer e fazer acerca do problema que estamos a viver, com as fronteiras europeias armadilhadas perante a demanda dos «filhos de um Deus menor», acossados pela guerra, pela miséria, pela falta de horizontes nos países de origem.

Imparável, no entanto, um grito tenho alojado na garganta. Imparável, é contra a ONU, cuja actuação, em função dos estatutos que afirma defender, de modo algum, consigo entender. E, até agora reprimido, este desabafo ruidoso tem como principal alvo um homem que até respeito, o António Guterres. A verdade é que, dependentes do Alto Comissariado para os Refugiados da ONU, há imensas coisas a fazer que não estão sendo concretizadas. Que eu e vós nos sintamos individual e até colectivamente impotentes, não surpreende. O que nos deixa perplexos é que o ACNUR nem sequer orientações forneça no sentido de que sejam desencadeadas medidas institucionais, formais e não formais que contribuam para a resolução do problema.

Se, no desempenho da sua dificílima missão, como parece, já terá esgotado todos os recursos e meios materiais e humanos e não consegue mais nada fazer, então demita-se. Demita-se, caramba! Dê o sinal que falta, do máximo desconforto, que só é protagonizado pelos homens dignos que não estão comprometidos seja com que cadeias forem de poder nacional, internacional, global. É que, se assim não for, parece haver razões para a suspeita de que o seu infernal silêncio, confundido com a conveniência de não levantar muitas ondas, até terá a ver com a possibilidade de sucesso de uma sua eventual candidatura a Secretário Geral.

No entanto, para que esta questão comece a ser resolvida a contento é mesmo preciso um desmesurado levantar de ondas que, em definitivo, desconstrua, destrua o ‘statu quo’ para a edificação de uma ordem nova.

O ambiente está insuportável. Como eu e nós há milhões de pessoas que já não podem mais, que esperam e desesperam por medidas dignas da Humanidade de que, constantemente, nos reclamamos.

O Papa foi a Lampedusa dar o grito de alarme. Então, e depois? Ficamos e estamos de braços cruzados. Como é possível?


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